sábado, 31 de maio de 2014

Luar

Voltei a olhar e não vi a Lua!
Gritava encoberta de nuvens cendradas que esvoaçavam lentamente na brisa dos novos ventos. Nuvens que vadiavam como almas soltas em inteira sintonia. Suportavam tempestades de outras horas.
Agora não chove.
Não vejo aqueles clarões a abaterem as paredes do meu sótão. Calou-se o alvoroço. O burburinho de agonias transformou-se numa silenciosa e nostálgica noite nublada onde os ventos sopram melodiosamente.
Perduram alguns destroços da tormenta. Vestígios que o tempo vai conduzindo, inventando uma nova paisagem bela de pranto. As nuvens também se vão esbatendo no baile do dia novo. O céu devolverá as estrelas e o fulgor da lua cheia.
Meu sótão, perfeita contemplação da viagem engastada. Nova vista sobre a noite ida. Sonho em movimento, perdido na vertigem da certeza de que a Lua me devolverá seu Luar.
E eu voltarei a olhar e aí verei a Lua!
Luar,
diferente principio será teu.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Liberdade

Que em tão velha memória se percam as dores das incertezas, presas na fuga de não querer ver. Ver o que as palavras não sentem. Ver o que o mundo não vê. Ver que a casa do inconsciente é feita de tábuas mal pregadas e telhados mal suportados, construídos em tardes atormentadas, noites mal acabadas.
VESTIR A PALAVRA DA RAZÃO É ENCOBRIR O GRITO DA INCERTEZA!
Tão certo o medo vence como a tempestade volta na sombra calma. Tão certa a noite vem e com ela a frescura da fome, a sede do que não se quer por muito que se queira. Essa sede és tu! Por mil portas que se fechem a fuga é constante. A fuga não vive em mim, a fuga é passiva de minha vontade. Cresce nas noites de silêncio onde mil sonhos se perdem na nossa verdade. A fuga vive em ti! Mil poetas com palavras de homens profetas sempre gritaram a fuga em cada cartada.
Não é mais fácil fugir?
Fugir não é perder a fome e ganhar a sede da alma nua, despida pela vontade de viver. É um grito sem sentido, abalado pela satisfação do que a razão alimenta… ou não. Alimentar o inconsciente através da sede do outro é perder o controle da razão. Que razão vive sem o descontrolo se até o próprio orgasmo de si é descontrolado? A fuga em si é descontrolo. Orientação desnorteada do que não se vê, sentido perdido na falsa certeza do que se quer ser.
O homem coragem não deu sentido à fuga. Correu a tormenta e encobriu os medos, fazendo deles a fronteira para a LIBERDADE interna, respeitando a sua natureza própria.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Casa de Sonhos

com voz doce e calma,
num tom quase impiedoso,
canta minha alma
a ânsia do caminho duvidoso.

canta o vazio,
a pasma paz com que me deito
e jaz a esperança roubada,
sonho perdido por defeito.

cantam ladrões, poetas,
canções de outras histórias.
passagens, palavras incertas,
fugidas na sede das memórias.

perde-se em mim a cantiga
de alicerce universal.
casa de sonhos erguida,
num cansaço de si habitual.

canção do rapaz sonhador tocada,
cantada com mil olhos de esperança.
brilhando a fuga numa nova alvorada,
a seu tempo voltarei a ser criança.